Como todos os dias se comemora o barulho, a poluição sonora, o ruído da mente cheia de ideias, decidiu-se celebrar o Dia do Silêncio. Inferências à parte, a sua comemoração anual foi por iniciativa da Organização Mundial da Saúde, para alertar sobre os malefícios da poluição sonora em nossa qualidade de vida.
O que o hinduísmo já apontava há alguns milênios de que o silêncio é o nosso maior aliado, atualmente ganha o status de bote salva-vidas no meio do oceano. Vivemos em sociedades atordoadas pelo consumismo, por natureza barulhento, que nos vende não só produtos desnecessários, mas também padrões de comportamento. Optar por uma conduta de vida mais reflexiva ou por viver momentos mais introspectivos, com práticas meditativas ou de oração, chega a ser subversivo.
Que o Dia do Silêncio nos inspire a sabedoria de aprendermos quando devemos rompê-lo.
SOM E SILÊNCIO
A voz que ressoa pelo canal da tua garganta
pode ser a chave que abre a cela em que um
ou milhares estão aprisionados.
Ou o som da tua própria alforria.
A quebra da mudez torturante
que asfixia.
A força do teu silêncio
pode ser o estardalhaço da tua serenidade
sobre a ignorância ruidosa
que se vangloria.
Mas o som da tua fala pode ser também o cadeado
que tranca a boca das minorias.
A expressão do autoritarismo
que se sobrepõe aos gritos dos desvalidos.
A mudez da tua indiferença
pode perpetuar por séculos a servidão
e a manifestação multiforme da violência.
Se por medo,
o calar da tua fala
produzirá também feridas na tua essência.
Há silêncio profundo e fala revolucionária.
Há fala excessiva e silêncio covarde.
Há escuta que salva e palavra que arde.
A voz que soa pelo canal da tua consciência
pode parar o bumbo do marchar da tirania
ou o mutismo que a sustenta.
O bom uso do som ou do silêncio
reside no exercício da tua sabedoria.
(Poema do livro “Quem tem ódio das borboletas?”)